domingo, 16 de setembro de 2012

A morrer…

COM MÚSICA


O único rapaz que alguma vez me “pediu namoro” está a morrer, foi-lhe diagnosticada uma esclerose lateral amiotrófica, tem entre 2 a 5 anos de vida.
A primeira coisa que senti ao saber foram remorsos, por ter gozado com ele há mais de trinta anos, aquando do caricato episódio. Depois tive vontade de o ver, de estar com ele. Finalmente, dei-me conta do ridículo de tudo isto.
A realidade é que, apesar de gostar dele, mal conheço o Miguel. É filho de amigos da minha família, que conheço desde que nasci é certo, mas com os quais pouco contacto tive ao longo da vida.
Por razões que não me recordo, houve um verão em que nos demos bastante mas, como já devem ter percebido, não houve namoro nenhum nem qualquer outro tipo de convívio posterior, a nossa relação tendo começado e acabado ali.
Voltei a encontra-lo há meia dúzia de anos. Não me pareceu lembrar-se de mim quanto mais do embaraçante pedido.

Perante esta morte anunciada pus-me então a pensar em quantos não nos irão deixar antes dele… ou mesmo se eu própria estarei por cá nessa altura para o acompanhar à sua última morada.
É que não ter data marcada não é de todo sinónimo de imortalidade, embora às vezes pareçamos esquecer-nos disso. No outro dia a minha mãe começou uma frase por “Se eu morrer…” e é assim que vivemos, a confundir o “se” com o “quando”.
Acontece que estamos todos “a morrer”, desde que nascemos.

O morto no caixão parece transformar-se imediatamente num “gajo porreiro”, quer o tenha efectivamente sido em vida ou não. Suponho que se deva ao facto de só querermos guardar como recordação o lado positivo de cada um.
Da mesma forma aqueles que, em vez de nos serem arrancados de repente, têm ocasião de olhar a morte nos olhos, gozam de estatuto privilegiado.
Na antecipação da sua perda, tendemos a perdoar-lhes coisas que não tínhamos perdoado, a dizer o que estava por dizer, a demonstrar sentimentos que até então esperávamos que adivinhassem. Ou seja, como bons humanos que somos, só começamos realmente a tratar dos assuntos quando se aproxima a “deadline”.

As pessoas não são melhores nem piores, mais ou menos relevantes nas nossas vidas, por estarem perante uma morte iminente e a nossa relação com as mesmas não deveria mudar em função disso.
O meu avô lutou com o cancro durante quinze anos tendo-nos todos preparado para a sua morte, incluindo a minha avó… que morreu atropelada dois ou três anos antes dele.

Meus amigos, a vida é aqui e agora. Se gostam de alguém digam-lhe, mostrem-lhe. Se têm assuntos inacabados, tratem deles. Se estão coisas por dizer, digam-nas. Acima de tudo, não só não percam a oportunidade como façam por passar tempo com aqueles que são importantes para vocês, porque não é preciso um diagnóstico negro para que eventualmente já não estejam por cá amanhã. E a realidade é que aquilo por que acabamos sempre por nos arrepender, não é dos erros que cometemos pelo caminho mas das coisas que deixámos por fazer.

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