quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Here’s looking at you, kid


Não sou daquelas mulheres que se babam com bebés, derreto-me com gatinhos e com cãezinhos, com humanozinhos nem por isso… Começo a achar graça às pessoas quando passam a ser gente, a responder, a dar luta. Mesmo então não gosto de qualquer uma, gosto mais de algumas crianças do que de outras, tal como se passa relativamente aos adultos.
Uma coisa é certa, gosto de pessoas e quando gosto, gosto muito, invisto, entrego-me.

Tive, durante muitos anos, um enorme desgosto… não suportava os filhos de duas das pessoas de quem mais gosto neste mundo, eram invasivos, malcriados, birrentos, intragáveis...
Os pais tinham noção disso mas não conseguiam fazer nada a esse respeito.
Até que um dia, em desespero de causa, decidiram arregaçar as mangas e meter-se num curso de “competências parentais”… Inútil será dizer que foram gozados até à medula por todos nós, que lhes perguntávamos porque tinham de pagar para ouvir o que lhes andávamos a dizer há anos.
Começo, por isso, por fazer aqui um oficial pedido de desculpas, resultou, conseguiram transformar três pequenos monstrinhos em adolescentes encantadores, sem excepções. Tiro-lhes humildemente o chapéu.

Mas a surpresa não se iria ficar por aí… quem havia de dizer que eu, a megera, a aterrorizadora de criancinhas, se iria deixar encantar por um deles?!
Já nem sei bem como tudo começou… foi acontecendo. Quando me apercebi que já não me mexiam com os nervos, passei a conseguir estar descontraidamente na sua presença. Dei-me conta que, em mais do que um sentido, se tinham tornado melhores seres humanos que eu era quando tinha a sua idade. As coisas foram seguindo o seu curso natural e, tendo mandado abaixo a barreira que os separava de mim, fomos começando aos poucos a interagir.

Os putos que nos rodeiam são geralmente os filhos destes ou daqueles, não passam no fundo de apêndices de algum agregado familiar, com quem mantemos uma interacção superficial.
Mas, de vez em quando,  algum  nos dá o privilégio de se transformar, para nós, num indivíduo per se, com quem criamos um relacionamento de um para um, independentemente de tudo o resto. Foi o que aconteceu com uma das miúdas.

Ela não é melhor nem pior do que os outros dois, simplesmente investiu nisso ou talvez seja a mais parecida comigo, a que sente mais empatia. A realidade é que ás tantas demos por nós a ter conversas dignas desse nome, a trocar mails, a partilhar ideias, a fazer coisas juntas…
Céus, como é gratificante fazê-lo com um espírito livre, que ainda não foi moldado pela sociedade, com alguém que ainda não sabendo grande coisa sobre a vida já tem maturidade suficiente para se colocar um montão de perguntas, para por em questão uma série de coisas. Numa idade em que tudo  parece ser a preto e branco acho fascinante introduzi-la aos tons de cinzento, encarar um ser humano em bruto e apresentar-lhe instrumentos para se moldar, para se transformar na obra prima da sua própria vida.

A certa altura falou em modelos, não quero ser modelo de ninguém, não acredito em modelos, acredito em posturas perante a vida. Acredito em vivermos de acordo com os nossos próprios princípios, as nossas convicções, aquilo que para nós faz sentido, interiorizando e aceitando que todos somos diferentes e as nossas escolhas não são mais válidas do que as dos outros. O nosso ser está em permanente evolução, aquilo em que acreditamos hoje pode já não fazer sentido amanhã e quantas vezes não decidimos  que não queremos continuar a percorrer o caminho que seguíamos. Não acredito em seguir as passadas dos outros, cada um de nós deve cometer os seus próprios erros, chegar às suas próprias conclusões.
A amizade, em qualquer idade, ajuda-nos a fazê-lo.

Para a Cat, 
a minha pequena grande amiga






COM MÚSICA

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