segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Do que a casa gasta…



     A vida é sem dúvida muito mais agradável quando as coisas correm bem. No entanto, apesar de geralmente preferirmos evita-los, os atritos, as crises, as aflições, as dificuldades,  podem revelar-se extremamente úteis, nomeadamente no conhecimento do próximo.
     Lidar com pessoas educadas e civilizadas é relativamente simples, sendo fácil manter relações cordiais com aquelas por quem sentimos um mínimo de empatia. Não é, no entanto, nos momentos bons que se descobre o barro de que cada um é feito.
     Por exemplo, os relatos dos grandes desastres (naufrágio do Titanic, queda do avião nos Andes, ataque às torres gémeas, etc) estão pejados de exemplos de gente aparentemente fantástica que na hora H virou bicho ou, pelo contrário, de mosquinhas mortas que acabam por se revelar verdadeiros heróis. De forma evidentemente menos drástica, pessoalmente confesso já ter tido grandes surpresas em ambos os sentidos.
     Em situações normais, a bem da harmonia e do entendimento, as pessoas fazem geralmente um esforço por ser simpáticas e agradáveis, escondendo, ou pelo menos refreando, frequentemente o seu verdadeiro eu. Quando as coisas dão para o torto é que geralmente a porca torce o rabo.
     Ora, as relações humanas não sendo pera doce, o conhecimento mútuo é fundamental, não só para compreendermos como lidar com determinado individuo, como para fazermos uma gestão eficaz das espectativas. 
     A forma como lidamos com desentendimentos, maus entendidos, divergências de opinião, conflitos de interesses, etc irá, muito mais do que a partilha de bons momentos, formatar a nossa relação futura. Uma relação amorosa, de amizade, de trabalho, que tenha conseguido ultrapassar positivamente momentos complicados, difíceis, tornar-se-há garantidamente muito mais sólida e valiosa. As coisas podem não ser agradáveis de viver no momento, mas permitem-nos tirar a prova dos nove.
     É nestas alturas que eventualmente caem as mascararas e descobrimos a careca a uma série de características. Quem assume responsabilidade pelos seus actos e quem sacode a água do capote. Quem tem coragem de manter posições que declarou e quem na hora da verdade se acobarda. Quem tenta efectivamente entender os outros e quem se recusa a considerar qualquer ponto de vista que não seja o seu. Quem cumpre com a palavra dada e quem dela se descarta quando lhe é mais conveniente. Quem assume e pede desculpa pelos seus erros e quem tenta virar o bico ao prego, seguindo aquela máxima de que a melhor defesa é o ataque.  Yada, yada, yada
     São as crises que nos permitem separar o trigo do joio, compreender em quem podemos confiar e com quem nos devemos sempre manter de pé atrás. Entender se podemos acreditar no que nos dizem ou se as coisas nem sempre são bem como no las apresentam. Perceber se as relações são equilibradas ou se, na realidade, damos muito mais do que recebemos.
     Ninguém precisa de mostrar o seu verdadeiro eu numa jantarada, numa ida ao cinema ou numa sessão de jogo. No convívio social do dia a dia tudo tende a ser meio cor de rosa, geralmente é em tensão que os homens deixam sair o seu eu mais profundo. Mas nem tudo o que sabe mal faz mal,  há definitivamente males que vêm por bem, neste caso que nos evitam perder tempo, investir nas pessoas erradas, entregar-nos a quem não devemos, partilhar a nossa intimidade com quem não nos merece.
     Sem problemas, podemos demorar anos a descobrir as verdadeiras cores de cada um




COM MÚSICA

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